Discurso Directo - Orivárzea

António Madaleno, 67 anos, é administrador executivo da Orivárzea, a maior organização de produtores de arroz em Portugal e a única que tem um modelo vertical de negócio: multiplica e comercializa semente de arroz, produz, transforma e comercializa arroz embalado. A sua marca “Bom Sucesso” gera 20 milhões de euros de faturação e é vendida desde a Europa, ao Brasil, passando pela China.

 

 

 

Como tornar a fileira do arroz em Portugal mais competitiva?

 

Atualmente a produção tem de ter uma visão mais próxima do consumidor, com uma visão meramente agrícola não consegue valorizar o arroz. Os agricultores devem dar um passo à frente, não podem deixar que seja a indústria a dar um passo atrás. Os agrupamentos de produtores (OP) são muito importantes, mas não podem limitar-se a concentrar a produção dos associados. Não digo que o modelo da Orivárzea seja o perfeito, há outras formas: troca de participações com as indústrias; ganhar escala e poder negocial através de união de várias OP.

 

António Madaleno, administrador executivo da Orivárzea

António Madaleno, administrador executivo da Orivárzea

António Madaleno (pai e filho), administradores executivos da Orivárzea

António Madaleno (pai e filho), administradores executivos da Orivárzea

 

Onde é que as Organizações de Produtores estão a falhar?

 

A produção não está organizada e por isso não tem capacidade de negociação com a indústria. Não posso conceber uma OP que não tenha um secador ou silos de armazenamento do arroz que lhe permitam vender quando for mais lucrativo. A consequência é que hoje em dia já há indústrias que fazem parte dos agrupamentos de produtores e estão a entrar em domínios que deviam ser um exclusivo da produção. Não critico, porque compreendo que é preciso capacidade financeira e normalmente as OP não a têm.

 

 

Como se constrói a capacidade financeira das OP?

 

Com muito trabalho e avançando para patamares acima. A Orivárzea tem 20 anos e só há 10 anos começamos a ter essa capacidade financeira. A atividade de secagem e armazenagem tem margens de lucro muito reduzidas, por si só não chega. O agricultor, e não falo apenas do produtor de arroz, tem que se aproximar do consumidor final, pois é ele que escolhe, que paga e pode ou não deixar valorizar o que produzimos.

 


 

 

Como têm conseguido afirmar a marca “Bom Sucesso” no mercado?

 

Desde sempre soubemos que só conseguiríamos afirmar a marca “Bom Sucesso” com arroz de qualidade superior e a diferenciação da embalagem: arroz univarietal Ariete, certificado IGP (Arroz Carolino das Lezírias Ribatejanas), embalado com atmosfera controlada e num formato diferenciado do habitual. A dona de casa ou o chef sabem que o arroz “Bom Sucesso” tem o mesmo comportamento culinário 365 dias por ano. Essa tem sido a nossa vantagem, apoiada por um bom trabalho de comunicação, mesmo com poucos meios financeiros.

Arroz Bom Sucesso


 

Como promover o arroz português?

 

A promoção do arroz português só será eficaz se for levada a cabo por aqueles que o produzem- os agricultores –, que estando longe do consumidor muito pouco podem fazer pelo seu arroz. Nós, na Orivárzea, temos uma visão muito diferente do papel do orizicultor, consideramos que a sua missão não termina na entrega do arroz com casca. É preciso ganhar escala, organização e ter muita disciplina para se conseguir defender os agricultores. As organizações como a AOP e a Casa do Arroz defendem o arroz nacional, mas é preciso mais consistência.

 

 

Quais os desafios para o futuro da Orivárzea?

 

Estamos constantemente a inovar para dar rentabilidade aos nossos agricultores. Em 2017, a Orivárzea iniciou ensaios para produção de arroz biológico, usando telas de solo biodegradáveis. Adquirimos uma máquina que faz um trabalho integral de preparação de solo, aplicação da tela e adubação. Este ano fizemos 40 hectares de arroz em conversão para MPB, em 2019 vamos repetir a mesma área bio e no ano seguinte aumentaremos para 100 hectares. Por agora estamos a aprender, mas o projeto da Orizárvea S.A. é produzir 240 hectares de arroz em MPB. Os clientes de Baby-Food estão muito interessados em arroz orgânico (biológico) para o segmento de comida para bebés e são cada vez mais exigentes com a matéria-prima. Pensamos que o preço será compensatório se analisarmos o preço do mercado atualmente.  Estimo que existam pouco mais de 1.000 hectares de arroz em MPB na Europa. É um fenómeno recente, toda a gente anda a testar, não é fácil de produzir. A Orivárzea está também envolvida num projeto para valorização dos subprodutos do arroz - a trinca, o farelo e a casca. É algo que não existe muito na Europa, ao contrário da Ásia.

 

 

Faltam ferramentas eficazes de proteção da cultura do arroz contra pragas, doenças e infestantes em Portugal?

 

Existe muita falta de produtos fitofarmacêuticos eficazes no controlo das infestantes, mas a retirada dos herbicidas com perfil toxicológico menos favorável é acertada. Porém o agricultor devia ser compensado por produzir arroz com resíduos próximo do zero, pois tem uma diminuição da produtividade da cultura e há 15 anos que recebe o mesmo preço pelo arroz. Outra questão diz respeito à importação de arroz tratado com produtos fitofarmacêuticos que estão proibidos em Portugal. É uma forma de concorrência desleal e o consumidor é prejudicado por consumir arroz com padrões de segurança alimentar abaixo dos que exige a legislação Europeia. Não deveria ser permitida a importação desse arroz.

 

 

Qual é a sua expectativa sobre as variedades portuguesas de arroz do Programa Nacional de Melhoramento?

 

Sou presidente do COTARROZ, que está a fazer um trabalho extraordinário, no entanto, o melhoramento genético e a seleção das variedades é um trabalho de paciência “de chinês”. Há 2 novas variedades inscritas no CNV – Ceres e Maçarico -, que demonstraram bom comportamento agronómico e culinário nos ensaios, mas não podemos exigir à partida que sejam as melhores do mundo. Só quando o Ceres, ou outra nova variedade nacional, provar ao agricultor e à indústria que é melhor do que as variedades lideres de mercado é que conseguirá afirmar-se.

 


«As exportações nacionais de arroz triplicaram nos últimos três anos e o potencial de exportação do arroz Carolino é enorme»


 

Que resultados práticos espera da Estratégia Nacional para a Promoção da Produção de Cereais?

 

A Estratégia pretende que o autoaprovisionamento de arroz atinja os 80% até 2022 (atualmente é de 60%), mas é preciso dizer que a área nacional de arroz não tem margem para crescer, não há mais terras disponíveis com as características necessárias para produzir arroz em Portugal. Outra coisa é conseguirmos aumentar em 20% o preço do arroz português, não deixaremos de importar arroz, mas geraremos mais valor na economia nacional. As exportações nacionais de arroz triplicaram nos últimos três anos e o potencial de exportação do arroz Carolino é enorme.

 


«A Orivárzea trabalha com a Lusosem desde a sua fundação, há uma ligação muito próxima entre as duas empresas»


 

Considera a Lusosem um parceiro no desenvolvimento da fileira do arroz em Portugal?

 

A Orizárvea trabalha com a Lusosem desde a sua fundação, há uma ligação muito próxima entre as duas empresas. Multiplicamos semente para a Lusosem, que por sua vez nos vende fitofármacos. Tem sido um parceiro fiável e agradável de trabalhar, com respeito mútuo e sempre com as contas direitas, que fazem os bons amigos.

 

 


ORIVÁRZEA EM NÚMEROS

 

A Orivárzea produz e comercializa 30.000 a 32.000 toneladas de arroz/ano, numa área de 4.700 hectares (dados de 2018) dos quais a própria Orivárzea tem em produção 1.070 ha onde produz a semente e outros arrozes diferenciados. Os restantes hectares pertencem a 48 sociedades agrícolas, sócias da Orivárzea e localizadas nos concelhos de Benavente, Salvaterra de Magos, Coruche, Vila Franca de Xira e Azambuja.


 

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