Entrevista ao Presidente do INIAV - Dr. Nuno Canada

Nuno Canada, presidente do Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária, revela que 90% da investigação do INIAV é desenvolvida em parceria com os agricultores para solucionar problemas concretos que estes enfrentam no dia-a-dia. No entanto, reconhece que o crescimento do setor agroalimentar necessita de maior investimento público em investigação e desenvolvimento, essenciais ao sucesso das empresas.

 

 

Nos últimos anos, tem sido prioridade do INIAV a aposta na transferência de conhecimento para os agricultores, numa política de maior proximidade. Como tem sido feito esse caminho?

 

Trata-se de uma mudança de paradigma. O objectivo do Ministério da Agricultura através do INIAV foi colocar-se ao lado dos agricultores para os ajudar a enfrentar os desafios que têm pela frente. O setor agroalimentar e florestal está a mudar muito rapidamente. Deparamo-nos com grandes desafios, como as alterações climáticas, pragas e doenças emergentes, necessidade de uso mais eficiente da água e da energia, da migração da economia linear para a economia circular, que obrigam a uma grande incorporação de conhecimento e tecnologia para serem colmatados. No anterior modelo de investigação os investigadores desenvolviam um projeto e só depois dos resultados obtidos é que se ia ver se podiam ser úteis ao setor. Logo a progressão era muito lenta. O modelo atual parte do setor, identifica os problemas que os agricultores têm e trabalha com agricultores e técnicos agrícolas na construção da investigação para ajudar a resolvê-los, depois à medida que as soluções vão surgindo, os próprios técnicos vão transferindo esse conhecimento para os agricultores. Foi necessário redinamizar a rede de experimentação, que estava praticamente desativada, para estarmos mais próximos das organizacões de produtores (OP) e da produção, de forma a dar resposta às necessidades do setor

 

 

E já existem resultados dessa mudança de paradigma?

 

Em termos concretos, o INIAV tinha 50% dos projetos em investigação fundamental e os outros 50% em investigação aplicada. Neste momento, houve um grande esforço para se apostar em projetos que abranjam todas áreas. Em três anos passamos de 60 projectos para 120. E cerca de 90% desses projectos são desenvolvidos em parceria com os agricultores para resolver problemas concretos que eles enfrentam. Atualmente, só cerca de 5% dos projetos é que são de investigação fundamental. Em alguns casos para se criarem agendas de investigação, foi envolvida a produção, indústria e investigação. Há um conjunto de áreas onde isso foi feito, através da criação de centros de competências. Existem 12 centros de competências que têm a sua agenda de investigação. Agora estamos a alinhar todos os projetos com as agendas de investigação das várias fileiras do setor agrícola e florestal. Pretendemos alinhar toda a investigação com as necessidades reais dos agricultores.

 

 

Quais são as principais fontes de financiamento destes projetos de investigação?

 

Concorremos a todas as fontes de financiamento possíveis e saliento que todas as candidaturas têm parcerias com as OP. Para financiar as agendas de investigação, há uma ferramenta muito importante, os grupos operacionais (medida do PDR2020), que já estão a ser implementados. Até ao momento, foram aprovados 110 grupos operacionais, sendo que o INIAV é parceiro em 50. A nossa política é dar primazia às OP para liderarem os grupos. Já para projetos de maior dimensão, com financimento superior a um milhão de euros, nomeadamente, na área da “agricultura inteligente”, trabalhamos com as empresas em projetos de cooperação. Estamos a preparar ainda um conjunto de projetos no âmbito da parceria para investigação e inovação na região do Mediterrâneo, PRIMA, criada pela Comissão Europeia.

 

 

E quais os projectos-âncora que vão marcar pela diferença o setor?

 

Na área agrícola as investigações procuram encontrar soluções transversais para o setor. Destaco uma investigação para melhoramento genético das variedades de trigo, mais adaptadas às alterações climáticas. É um projeto em parceria com o instituto público francês de investigação agrária Arvalis, e com um centro de investigação da Tunísia. Vão ser testadas variedades do programa nacional de melhoramento e do programa de melhoramento francês, em paralelo no sul de França e em Portugal, com diferentes resistências à seca, envolvendo tecnologia de ponta na captação e tratamento de dados. Já para as pragas e doenças, intensificadas em virtude das alterações climáticas, saliento um projeto para a deteção precoce da flavescência dourada na vinha, em cooperação com a Tekever, empresa que se dedica ao fabrico tecnologia relacionada com sensores e drones. Está a ser desenvolvida tecnologia de imagem que permitirá diagnosticar a doença da Flavescência dourada na vinha com a utilização de drones. Com este equipamento é possível percorrer grandes áreas e determinar precocemente doenças, minimizando o uso de produtos fitofarmacêuticos e favorecendo a sustentabilidade ambiental.

 

 

Qual a estratégia para os pólos do INIAV?

 

Descentralizar o mais possível. Foi necessário reativar, reabilitar, investir em equipamento e recursos humanos qualificados. Contratámos 20 novos doutorados.  Por exemplo, no polo de fruticultura em Alcobaça só tínhamos 1 investigador e agora temos 4 e estamos a trabalhar com 20 organizações de produtores de todo o país. Foram identificados em conjunto com estas OP os principais problemas do setor e definimos agendas de investigação a curto, médio e longo prazo. A pós-colheita, bem como a investigação em pomóideas e prunóideas são as principais  áreas de intervenção. Nesta Estação Experimental concorremos no ultimo ano a diversos projetos de investigação e, neste momento, já estão em curso cerca de 10 projetos de investigação aplicada. Outro exemplo é o trabalho que está a ser efetuado no Banco Nacional de Germoplasma Vegetal, em Braga, onde foi concentrada a conservação dos recursos genéticos vegetais que se encontrava dispersa pelo país. Com a aposta em recursos humanos altamente qualificados, existentes e contatados, triplicamos as candidaturas a programas de financiamento e duplicamos os projetos em curso. Vamos contratar mais investigadores este ano. O setor agroalimentar tem crescido muito, por exemplo nas exportações está a crescer ao dobro da média nacional, mas o investimento em Investigação e Desenvolvimento não tem acompanhado este crescimento. As empresas precisam de investigação e inovação para terem sucesso, e sendo este um setor bandeira do país, faz sentido alocar um peso maior dos recursos para a investigação e inovação ao setor agrícola, pecuário e florestal. A maior fatia de financiamento vem do Portugal2020, principalmente através dos programas operacionais regionais e do PDR2020.

 

 

O que levou à criação no polo de Elvas de um Centro de Estudos para as Alterações Climáticas?

 

Na génese do atual polo de Elvas do INIAV está a Estação Nacional de Melhoramento de Plantas e, neste contexto das alterações climáticas, um dos eixos centrais em que faz sentido apostar,sem dúvida,é o melhoramento genético orientado para a adaptação às alterações climáticas. Mais do que uma componente nacional, pretendemos que este centro de estudos tenha uma vertente internacional. Em Fevereiro reunimos com entidades e investigação de Espanha para concertarmos uma estratégia ibérica para a investigação no mediterrâneo. O roteiro cultural de há 20 anos hoje já não funciona, é necessário afinar as praticas de um ano para o outro, porque cada ano apresenta condições atmosféricas diferentes. E por isso estamos a apostar na formação dos agricultores para este tema, no polo de Elvas. Está a decorrer a segunda edição deste curso que ajuda os produtores de cereais na tomada de decisões ao longo de todo o ciclo produtivo.

 

 

E quanto às Redes de Experimentação, anunciadas em 2017 pelo Ministério da Agricultura, já são uma realidade?

 

O Ministério da Agricultura tem um conjunto de instalações de experimentação que se encontram dispersas por vários organismos como o INIAV, as direções regionais de agricultura e o Instituto de Conservação da Natureza e Florestas. Mas nunca houve uma visão integrada. Agora olha-se para a estrutura como um todo, que deve trabalhar em parceria com as OP. A incorporação de conhecimento e tecnologia e a sua transferência tem que estar ao lado dos agricultores no terreno. O INIAV tem os seus polos, mas vai integrar com mais entidades as Redes de Experimentação. Envolve todas as quintas que o ministério identificou com interesse para investigação e experimentação e as quintas das escolas agrárias. Esta rede vai permitir que os centros de competências e os grupos de trabalho tenham um espaco fisíco, independente do Estado. No âmbito da agricultura de precisão vamos ter uma quinta modelo onde as empresas possam desenvolver a sua tecnologia, efetuar testes, demostrações e dar formação aos agricultores sobre como utilizar estes equipamentos.

 

E na prática o que já está a ser feito?

 

Para já, o mapa de quintas e o plano estratégico está validado e estamos a implementar as investigações nos diferentes espaços. Para financiamento será replicado o modelo que temos no INIAV. Pretende-se que a médio longo prazo as Redes de Experimentação sejam um ecossistema que junte empresas, investigação, equipamentos, técnicos agrícolas e de negócios. As spin-off têm uma mortalidade relativamente elevada, em parte, porque não têm uma visão alargada de conhecimentos. Possuem conhecimentos técnicos de agricultura, mas falta uma visão empresarial. Pretendemos ajudar empresas de base rural até terem asas para voar.

 

 

Destaques:

 

  • «Foram aprovados 110 Grupos Operacionais no PDR2020, o INIAV é parceiro em 50»

 

  • «Triplicámos as candidaturas a programas de financiamento e duplicamos os projetos em curso»

 

 

Nuno Canada, presidente do INIAV

Nuno Canada, presidente do INIAV

 

Benvindo Maçãs, coordenador do pólo de Elvas do INIAV com Nuno Canada

Benvindo Maçãs, coordenador do pólo de Elvas do INIAV com Nuno Canada

 

Feijão Tarrestre recuperado para produção comercial a partir de variedade conservada no Banco Português de Germoplasma Vegetal em Braga

Feijão Tarrestre recuperado para produção comercial a partir de variedade conservada no Banco Português de Germoplasma Vegetal em Braga

 

Ensaio de sistemas de condução em amendoeira e adaptação à colheita mecânica a decorrer  no âmbito de um protocolo experimental

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Ensaio com filmes refletivos para aumento da coloração das maçãs a decorrer no âmbito de  um protocolo experimental

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